Friday, December 30, 2005

Despedidas do ano

O dia esteve fusco, chovinhante e sem horizonte. Entretive-me com os trabalhos eternos, cozer cera, arranjar quadros e limpar colmeias mortas, que sempre aparecem.
Amanhã vou ao campo para as despedidas do ano. Anseio pela chegada do Ano Novo que espero seja o Ano Bom.

Thursday, December 29, 2005

De seu nome José

Faria hoje oitenta anos.
Com os seus olhos azuis escuros, as suas barbas louras, bem aparadas, os fatos que faziam a sua elegancia, parecia um principe romântico saído dalgum filme de Visconti. E sendo um introvertido, não deixava de, nos dias bons, estar igualmente à vontade no salão de uma embaixada, ou na casa simples do nosso vizinho" João da Bufarda, de volta de uns tintos , uma farinheira e uma boa cavaqueira junto ao lume de chão. Afinal, para ele, os homens eram mesmo iguais.
Foi este, o primeiro apóstolo da humanidade que eu conheci, um homem com dificuldades manifestas em dizer não, para quem o trabalho era a redenção da alma.
Pena que sendo ambos introvertidos, a comunicação frequentemente não fluia. Lamento-o agora, já tarde. Mas é para mim, sempre, um ausente presente , tão presente enquanto eu cá estiver a contar as suas histórias, a sua presença de homem brilhante.
De seu nome José, o meu pai.

Tuesday, December 27, 2005

O Natal do professor

O Natal parece ter sido inspirador para o professor de finanças.
Veio hoje anunciar que sugereria ao governo, um secretário de estado para o investimento estrangeiro. Áparte o despropósito de um putativo presidente vir propôr orgânicas para o governo, extravasando os seus poderes e competencias, não cabe na cabeça de um razoável economista , supor que o investimento estrangeiro aparece por obra e graça de um secretário de estado. É que infelizmente as " oportunidades " da globalização não passam por aqui....

Monday, December 26, 2005

Prendas ou nem tanto

A chuva veio visitar-me, oferecer-se-me como a minha melhor prenda de Natal. Tive prendas poucas, mas boas. Todavia estive ausente do espirito do Natal, um pouco azedo e desencontrado da felicidade.. Ainda assim, deliciei-me com paparocas, pudins e alegrias infantis.

Wednesday, December 21, 2005

Este filme eu já vi

Os trabalhadores da Autoeuropa que, ou estarei enganado, até não são mal pagos, não se conseguem entender com a empresa em matéria de actualização de salários.Estão no direito de reinvindicar mas parece-me que o filme é claro.
Nos tempos que correm uns têem a faca e o queijo na mão, enquanto outros não.Este é o melhor caminho para que a Autoeuropa faça as malas para paragens mais apeteçiveis, deixando no desemprego quem lá trabalha, entregues ao subsídio de desemprego ou a outra actividade mais mal paga.
Esta história, ilustra a irresponsabilidade de uma certa esquerda, que vê as relações do trabalho na dicotomia entre os bons e os maus; os trabalhadores zelosos e abnegados, os patrões perversos e incompetentes que arruinam a vida dos trabalhadores com a sua incúria .
No mundo actual, no rumo que leva, não há margem para aumento de salários . Com a globalização, quem nivela as condições de remuneração e protecção social , são os países em que tudo está desregulado e os trabalhadores ganham misérias.Defender as nossas condições sociais é questionar a liberalização das trocas comerciais .E não se pode fazer uma coisa sem a outra.A esquerda que o não faz, está objectivamente a fazer o jogo da direita.

Tuesday, December 20, 2005

O debate da viragem

Arre que é preciso vir um homem de oitenta e um anos, para deixar o professor de finanças a pão e laranjas.

Monday, December 19, 2005

O silencio dos adormecidos

Já dormem. Aproximo-me em passos mansos, a cirandar contemplativo. Nenhum ruído, nenhuma presença, perturbará o silêncio dos adormecidos.
Mais um dia que chega ao fim, mais um dia no lento burilar da minha empreitada maior. Os meus filhos.

Sunday, December 18, 2005

Um apicultor no inverno

Um domingo tranquilo é em casa, ocupado nos mil e um afazeres de apicultor em época semi-baixa. Desde serrar lenha, a cozer quadros com cera, passando por arrumar centenas de alças e aramar quadros que vão voltar a ter cera, tudo isto, e mais ainda, são o dia corriqueiro de um apicultor que tem que adiantar trabalho para a primavera.
Há pouco lazer no inverno de um apicultor.

Saturday, December 17, 2005

A ocasião perdida

Hoje Manuel Alegre perdeu uma óptima ocasião para estar calado.
Também ele, tal como Cavaco e Jerónimo, estudou pela mesma cartilha. Tambem ele quer manter a prostituição como está, isto é, sempre presente, mas ilegal. Ninguém explicará a estes homens que legalizar a prostituição não implica permitir o proxenetismo ? Porque confundem alhos com bugalhos?
Um está no campanário da igreja , os outros dois vivem no século passado.

Friday, December 16, 2005

anticiclone

As noites são gélidas, o amanhecer mostra os campos alvos de gelo. O sol sobe no horizonte azul e límpido,como nos melhores dias do paraíso. Dirão os citadinos que são "dias bonitos", mas eu vivo-os com inquietação. Foram dias assim que trouxeram a tragédia climática do ano que está agora a acabar.
Em meteorologia, tudo se explica com o anticiclone dos Açores que está posicionado de modo a não permitir a entrada do ar oceânico, que traz as chuvas até nós. O dito anticiclone está confortavelmente instalado aonde não deve e parece estar a gostar porque não sai do sitio.

Thursday, December 15, 2005

tookie@tookie.com

Depois de passar anos e muitos trabalhos, na prisão, Stanley Tookie Williams foi executado com uma injecção letal.
Depois de 24 anos de prisão em que aproveitou para fazer de si um outro homem,
como o reconheceu o próprio presidente dos Estados Unidos quando o condecorou pela sua acção cívica, deixou Tookie de estar à nossa distancia de um mail.
Como bem escreveu Nuno Pacheco, no Público de ontem, após 24 anos de encarceramento, conseguiram poupar o criminoso e matar o homem decente que nele nasceu .

Um alentejano na cidade

É um homem grande, de bigode e suiças negras, olhos luzidos e sorridentes. Joaquim Falcoeiras é sua graça, e anda por fora do alentejo há anos demais para a sua felicidade.
Mas foi preciso tratar da vida e para isso rumar á capital, onde está sempre com o pensamento no alentejo, na casa da aldeia que o espera, pois "em Lisboa eu não morro, só se a morte me apanhar sem aviso".
Com a mulher abriu estabelecimento de comidas, empresa familiar, aonde se cultivam os temperos da terra madre e se respira nostalgia pelo alentejo. Lá longe, lá na terra, ficaram oliveiras e memórias. Joaquim, bailam-lhe as meninas dos olhos quando diz:
-Dou mais valor a uma oliveira do que ao Cristo-Rei.
E eu também.

Tuesday, December 13, 2005

Os beatos presidenciáveis

No debate televisivo de hoje entre Cavaco Silva e Jerónimo de Sousa, numa coisa estiveram eles de acordo: há que manter ilegalizada a prostituição.
É uma ideia conservadora que vai beber, num caso ao campanário da igreja, no outro caso, ao moralismo pretensamente revolucionário comum a muitos comunistas. Pois eu acho que há que legalizar, porque é essa a forma de retirar tal actividade do campo da marginalidade, território propício ao florescimento de todas as violências , bem como da escravatura sexual.Legalizar é uma forma de pôr a prostituição mais às claras, mais controlada e enquadrada na sociedade , poder dar direitos reais às mulheres-ou aos homens-das "industrias" sexuais. É hipócrita pensar que se pode acabar com a prostituição- a história da humanidade comprova-o- e em nome da dignidade querer manter tudo como está.
E deixemo.-nos de tretas, vender, vendemo-nos, todos o fazemos um pouco. Uns vendem a sua inteligencia, outros vendem a sua criatividade, outros vendem a força do seu trabalho manual ou braçal, outras ou outros vendem o seu corpo sexualmente, outros vendem ilusões. O que interessa é que todos tenhamos segurança no que fazemos, sejamos respeitados e defendidos pelo estado. E já agora não levemos constantemente "chás" de moral.

Monday, December 12, 2005

Os bonecos

Hoje levei os meus príncipes ao teatro, a ver os "Bonecos de Santo Aleixo".
Os bonecos vão-se-me impondo como um ritual de Natal imperdível.
São um monumento da cultura popular do alentejo, mantêm viva uma certa forma de falar que já pouco se ouve, com personagens pícaras, malandrecas, como o costumam ser as marionetas, ilustração de um modo de viver em extinção.
São marionetas para adultos, que podem apreender plenamente o sentido dos diálogos e saborear o perfume das palavras, mas nem por isso os meus rapazes, de seis e três anos, deixaram de resistir com galhardia a hora e meia de espectáculo, o que também mostra que as marionetas, também valem pela arte da movimentação dos bonecos e pelo acompanhamento musical, contribuindo para que possam ser vistas e apreciadas no mundo inteiro, não entendedor do português.
E talvez um dia, já homens, os meus rapazes, recordem este recorrente acontecimento do nosso Natal.
O irem ver os bonecos, com o pai.

Habitat

Hoje sinto-me aquecido na tua luz solar. Habitas-me nos teus gestos, na tua actividade vizinha de mim, na banda sonora dos afazeres. Existes aqui ao lado e isso é-me deliciosamente orgânico. Estou povoado de ti, como se me corresses pelo sangue. És hoje o meu habitat.

Sunday, December 11, 2005

A matilha

Mário Soares é já uma figura cimeira do século XX português a quem Portugal muito deve antes e depois do 25 de Abril. Como eu, muitos portugueses assim pensam, talvez a grande maioria. Mas em política o crédito não é eterno e na vida é bom ter sempre bem presente qual o momento de nos irmos embora, dalgum lado ou de alguma coisa, onde fomos felizes. Oitenta e um anos bem vividos, deveriam ter sido tempo suficiente para bem apreender esta regra da vida.
Mais aborrecido que isto, é o ambiente circundante ao candidato, que aliás o tem contagiado. Se Mário Soares é para mim respeitável, já não o são nada, os guardiões da pureza partidária, os "yesmen" da venealidade, que abominam tudo quanto cheire a integridade ou obediência a princípios. Pelos vistos têm direitos de propriedade adquiridos sobre o partido, sobre as eleições, sobre o país.
Pobre país este que parece um despojo, uma carcaça de ossos, disputada por uma matilha rafeira.

Saturday, December 10, 2005

Alegre

Manuel Alegre é demasiado genuíno para ser um político. É demasiado poeta para ser eficaz na arena da política, talvez por isso, tem a minha admiração, respeito e apoio. Principalmente é importante que vingue dalgum modo, aquilo que a sua candidatura representa de desobediência, de reencontro com a participação cívica e com genuínos valores da esquerda socialista.
A" gracinha" do post anterior resulta da necessidade de um apicultor de escassas colheitas dilatar os proventos. Assim se inventou um delicioso frasquinho de umas 30 gramas de mel, um frasquinho sedutor que me inicia na missão de vender mel à grama.

uma gracinha

ilustrar os dias

Ilustrar os dias é uma brincadeira higiénica.Uma disciplina do quotidiano, vital como a alimentação, o sono. Estimável como lavar os dentes ou dar corda ao relógio. Sim o relógio, dar corda ao relógio dos nossos dias, colocar-me em dia com a vida que me habita e que todos os dias se esvai, por vezes sem nada que a recomende ou recorde. É esta uma forma de tomar o sentido aos dias, mesmo aos pequenos nadas de todas as horas, de ser importante ou insignificante, como todos o somos em iguais doses.