Longos dias de Setembro
Longos dias tinha Setembro. Ainda hoje tenho ânsias de ver
aparecer os meus, num carro a crescer para cá do horizonte. O meu pai chegava ao final da semana e era festa. Com ele
vinha a luz, era ele quem sabia acender o pétrómax, a libertar-nos da penumbra
dos candeeiros de petróleo. Em Setembro, a minha avó Isabel, de olhos de azeitona verde
e espirito dócil, assentava arraiais na quinta, em mês vindimo de uvas, figos e
rendas do senhor Adelino. Entretinha-se a regar de regador, todos os finais de
tarde, uma alameda de lírios roxos que nunca se viam floridos por falta de
comparência à Primavera. Eu percorria a quinta pedalando e sonhando com
pássaros desconhecidos, pelos intervalos das sestas obrigatórias, à tardinha ia
com a Noémia, criada de servir desde sempre e que me viu nascer e crescer,
buscar o leite à cocheira do senhor Adelino, aonde três vacas tourinas eram
ordenhadas para um balde de folha. Ficava pasmado a ver as bolinhas amarelas à
superfície do leite. O meu pai chegava de Lisboa quase à noite, trazia a luz mas
apreciava a penumbra, criado entre granitos nas serras beirãs, do que gostava
no verão alentejano era das noites tropicais. Sentávamo-nos quietos a deixar
falar os bichos noturnos, grilos, mochos e afins ou esticávamo-nos na laje do
casito, ainda morna da canícula, cada qual apenas falando com os astros, o luar
e suas sombras, o meu pai a remoer um verso, por vezes se dizia qualquer coisa
bem medida. Bastava-me aquela presença serena que chegava sem imposições nem
normas. Trazia a luz e encurtava os dias, fazia deles setembros.
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