Tuesday, November 27, 2012

O bastardo

Homens seriam valentes, em fazendas e mulheres que possuíssem, legítimas ou outras, que de tudo se fazia usucapião.
Aquele lavrador, famoso por umas botas que perdeu em arramada alheia, em apressadas despedidas de uma amiga, dela teve varão, afastado dos sagrados sacramentos, nascido e criado de pai incógnito, ainda que do povo fosse bem conhecido. Da bastardia não se livrou o fruto desses escondidos amores, e a vida levou fora da fala do pai natural, bem como das suas heranças, herdadas pelos legitimos irmãos. Foi uma vida num lugar ermo, entre serras, trabalhos esforçados, vida de recoleção, caça, e outros nadas.
Era um pobre diabo que andava léguas a pé, esfarrapado, cheirando a fumo, de mau viver em casa sem janelas, nem chão, nem companheira aconchegadeira, descendência ou familia chegada, um sem eira nem beira que ali estava.
No dia em que mudou a moeda, saltou da sua vida anónima e pequenina, ao chegar ao banco, com uma saca do trigo carregada de escudos, para trocar pelos novos euros.
Jogou-se à estrada de boleia, a caminho da vila com uma saca às costas, que ninguem imaginava podesse conter uma pequena fortuna em notas enroladas, amarfanhadas, que levaram o gerente do banco a encerrar extraordinariamente a agência, para em sossego, se contarem uns largos milhares de contos em notas coçádas, mal amanhadas e pior acondicionadas.
Voltou para casa com a saca cheia de notas de euros, para a sua vida contada, e agora, um pouco menos anónima. Mas só lhe ficou a lenda da saca de notas, parece ter desaparecido, ascendido aos céus por entre as estevas, um pobre diabo assim, torna-se um homem invisivel, ou um morto que a ninguem , nem ao proprio diabo lembra.

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