Tuesday, August 29, 2006

A artista do filme da minha vida

Saturday, August 26, 2006

O país do meu pai

O meu pai começou por dizer que a Europa começava nos Pirinéus.
Nos anos sessenta, os países ibéricos não pertenciam à categoria dos países civilizados aonde se respirava liberdade, havia democracia política, níveis de desenvolvimento económico, cultural,educacional e cívico. A democracia e a Europa, foram o projecto da vida da geração do meu pai e conseguiram-no, em parte.
Mas neste cantinho à beira mar, continuamos de olhos pouco abertos ao mundo. Na Holanda 30% das crianças nasce em casa, em Inglaterra são 20% e na Espanha, o parto em casa é opção nos seguros de saúde, com boas parteiras e acompanhamento médico se necessário. Em Portugal, nem se coloca tal escolha. Temos um ministro contabilista que encerra maternidades com a argumentação chico-espertista da segurança. Diz ele mais os seus "sábios", que maternidades com poucos partos não garantem segurança, que quantidade é sinónimo de qualidade. São opções ao arrepio do que se faz já noutros lados do mundo, na Europa em particular. O que os faz pensar que são melhores que os outros? O que é esquisito é que o país acredita.
No final da vida, o meu pai corrigiu a delimitação da Europa. A Europa começava no Caia.
E continua a começar aí.

Monday, August 21, 2006

Os cardos do campo branco

Um pouco por todo o Alentejo há uma discreta floração de Agosto, um cardo de flor amarela a que chamam o cardo asnil ou cardo dos burros.
No campo branco- a planície cor de pêlo de camelo, aonde uma árvore é um mero acidente da paisagem, para os lados de Castro Verde e Almodôvar- o verão é dos cardos e dos Sisões.
O horizonte é interminável, esbatido numa bruma de calor constante. Para lá transumei colmeias, perseguindo a miragem de um escasso néctar, uma minguada oferta da natureza.
Agosto é o mês das branduras de Verão, as orvalhadas. O cardo bebe essa escassa água da madrugada e devolve-a na forma de néctar, ao sol das manhãs do estio. Com ele, fazem as abelhas um mel improvável e denso, de cristalização rápida e coloração tendencialmente branca aquando da chegada dos primeiros frios do outono, que logo o solidificam.
Poucos homens do campo, poucos móirais de rebanhos, imaginam a serventia que estes cardos podem ter, para além de picarem a focinheira dos gádos, mas este, é mais uma riqueza escondida da natureza áspera do verão alentejano.

Sunday, August 20, 2006

Vendedor de frascos de mel

Descobri tardiamente uma realidade simples. Um apicultor não é apenas um produtor de mel, é também um vendedor de mel. Congeminei rótulos, marcas, recorri a duas excelentes designers, a Cristina Oliveira e a Sandra Paulino, e posso dizer que criei excelentes méis, apresentados em óptimos rótulos.
Depois começou o trabalho de sápa, por todas as vilas e cidades, até aos confins de avenidas e ruelas, a escarafunchar em tudo quanto é supermercado, charcutaria ou mercearia mais ou menos manhosa. Já vai havendo quem valorize um bom produto, numa boa embalagem, mas esses, ainda são uma minoria muito minoritária. Imperam os merceeiros que não têm olhos, mas sim uma máquina de calcular e também aqueles, que não percebem nada de nada do que estão a fazer. No meio desta selva estéril , há um ou outro que são um alento, um prazer de lidação, com quem se conversa bem e até apetece voltar. Por estes dias, entro profundamente numa feira de gente, de pessoas comuns que têm o poder de determinar aquilo que as outras pessoas comuns podem escolher, e a isto se chama o mercado, em economês.
Quanto mais caio na realidade, mais percebo que isto é um jogo de sombras e que todos os dias nos contam histórias da carochinha ácerca da nossa consabida liberdade de escolha quotidiana.

Saturday, August 19, 2006

Cal

A brancura parece ter um cheiro, um odor de limpeza da terra.
Comprei cal em pedra e fervi-a numa lata.
Munido de pinçéis e trinchas, meti mãos á obra. Diante de mim, uma casa de paredes grossas, a chorar por cal. Sobraram salpicos em todas as direcções, na roupa, no cabelo, nos pés . Séca as mãos, fura a pele, faz doer os olhos de tanta claridade. Mas o resultado é magnífico, não há penas que cheguem perante tanto branco, tanta luz.
Eu diria que na depuração da casa começa a nossa felicidade, ou simplesmente, como proclama uma velha senhora, minha vizinha:
- Não há nada como o asseio!

Thursday, August 17, 2006

Águas de Agosto

Amanheçe de mansinho a chuvinhar. Gosto desta pausa na canícula alentejana, que segue dentro de escassos dias. Os pastores não gostam destas chuvas a destempo, estragam as pastagens , fazendo germinar erva, condenada a morrer à secura do estio, que ainda por cá se demora. Mas eu gosto, alivia-me o peso dos dias, introduz variação na cor dos sentidos, enfim, respiro melhor. E que bom, o cheiro da terra molhada.